Antonio Carlos Duarte Sepúlveda: 'É fundamental que o setor se prepare para os impactos da instabilidade climática'
Referência em operações portuárias e logísticas do país, Santos Brasil amplia investimentos e passa a receber navios gigantes.
Antonio Carlos Duarte Sepúlveda, diretor-presidente da Santos Brasil. (Foto: Divulgação)
O Tecon Santos, um dos maiores terminais de contêineres da América Latina e o mais eficiente do país, administrado pela Santos Brasil no Porto de Santos, começou a receber um novo serviço de longo curso que reúne as maiores embarcações em capacidade de carga conteinerizada que chegarão regularmente à Costa Leste da América do Sul.
Na parceria firmada com a CMA CGM e Cosco, a Companhia receberá semanalmente navios de uma frota composta por 12 embarcações da classe Latamax, que têm 336 metros de comprimento, 51 metros de boca e 14,5 metros de calado máximo permitido. A previsão é que, em cada atracação desta categoria de navios gigantes, cerca de 5 mil contêineres sejam operados no terminal.
Listada no Novo Mercado da B3, a companhia já investiu mais de R$ 9 bilhões em aquisições, expansões, equipamentos, tecnologia e pessoas, tornando-se referência em operações portuárias e logística integrada e um importante player em infraestrutura. Por meio da Santos Brasil Logística, que opera de maneira integrada aos terminais, oferece soluções completas do porto ao e-commerce aos seus mais de 9400 clientes.
Diretor-presidente da Santos Brasil desde março de 2010, Antonio Carlos Duarte Sepúlveda é formado em Engenharia Civil pela Universidade Federal da Bahia (1989), tem MBA em Gerenciamento Financeiro pela Saint Joseph´s University – Filadélfia (1991) e atua no setor portuário desde 1992. Nesta entrevista, Sepúlveda destaca atuais perspectivas de crescimento do setor portuário e os investimentos da companhia para aproveitar este momento.
Revista LIDE: Quais são os principais planos da companhia para ampliar suas receitas e investimentos no país nos próximos anos?
Antonio Sepúlveda: Nossa estratégia de negócios está baseada em três principais frentes: terminais de contêineres, terminais de graneis líquidos e logística integrada ao porto. Estamos muito focados no aumento da capacidade dos nossos ativos para ter infraestrutura disponível, garantindo assim o espaço para crescimento das exportações e importações dos nossos clientes. Para 2024, a nossa previsão é ampliar esse valor e investir entre R$ 650 e R$ 730 milhões.
No Tecon Santos, que é um ativo único no maior porto do país, responsável por 35% da corrente de comércio do Brasil, iniciamos em 2019 o ciclo de investimentos no atual projeto de ampliação e modernização do terminal. Do total de R$ 2,6 bilhões previstos, já investimos R$ 1 bilhão e, neste ano, vamos investir mais R$ 400 milhões para elevar a capacidade do terminal dos atuais 2,4 milhões de TEUs (medida equivalente a um contêiner de 20 pés) para 2,6 milhões de TEUs.
Em Itaqui, onde iniciamos nossa operação de graneis líquidos no ano passado, investiremos cerca de R$ 270 milhões em 2024. Atualmente temos 50 mil m3 disponíveis e em operação e a previsão é chegar a 110 mil m3 ao final de 2024 e em 190 mil m3 no ano seguinte.
Revista LIDE: Em relação ao escoamento da produção do agro nacional, como a ampliação da infraestrutura ferroviária tem impactado a operação dos portos?
Antonio Sepúlveda: O modal ferroviário vem ganhando espaço na logística brasileira, trazendo enorme competitividade ao nosso comércio exterior. A transferência de cargas do modal rodoviário para o ferroviário tem impacto positivo nas cidades e nos portos porque alivia o tráfego nas rodovias e nos acessos urbanos. Ela também direciona grandes volumes aos portos, criando um ciclo virtuoso de novos investimentos e geração de riqueza.
Revista LIDE: A questão de armazenagem tem sido apontada ainda como um grande gargalo, como a empresa tem atuado nesse ponto?
Antonio Sepúlveda: No caso da carga conteinerizada no Porto de Santos, tivemos uma redução muito grande no tempo de permanência das cargas. Os avanços tecnológicos na Receita Federal têm proporcionado desembaraço de mercadorias em menos de dois dias, reduzindo bastante a demanda por espaço. Por outro lado, há um aumento de demanda para as cargas de transbordo, principalmente em função da BR do Mar, que aumentou a oferta de navios de cabotagem na nossa costa. A Santos Brasil vem investindo muito na ampliação de seus pátios e chegaremos esse ano 2,6 milhões de TEUs de capacidade no Tecon Santos. Pretendemos chegar a 3 milhões de TEUs de capacidade até o final de 2027. Acreditamos que com essa capacidade manteremos a demanda atendida.
Com o crescimento constante das exportações, quais são os demais entraves e desafios logísticos para o setor nesse momento no Porto de Santos? Os recentes anúncios de projetos rodoviários na região devem ajudar?
Eu diria que os acessos são os principais entraves ao crescimento do Porto de Santos, tanto o marítimo quanto os terrestres. No que se refere à dragagem, estamos atrasados. O calado dos navios New Panamax, de 366 metros, fundamentais para redução do frete, é de 15,5 metros e hoje o Porto de Santos opera com 14,5 metros somente na preamar. Já quanto aos acessos rodoviários, é preciso concluir os investimentos nas perimetrais e começar a pensar em uma alterativa ao sistema Anchieta-Imigrantes, com uma terceira pista. Temos também um problema sério de falta de mão-de-obra, já que os terminais do porto público têm, obrigatoriamente, que contratar profissionais ligados ao Órgão Gestor de Mão-de-Obra (Ogmo). É fundamental a modernização da legislação portuária no que se refere à mão-de-obra. Só na Santos Brasil, iniciamos o ano com cerca de 400 vagas abertas e não preenchidas por falta de candidatos.
Sobre os investimentos anunciados, a informação que temos é de que o governo está colocando um foco muito grande no aprofundamento do canal e a dragagem deve ser concluída até 2026. Têm sido anunciados também investimentos nas perimetrais, que são indispensáveis para o crescimento do porto.
As mudanças climáticas já afetam o setor logístico-portuário no Brasil. Como a empresa tem se preparado neste sentido?
É fundamental que o setor se prepare para os impactos da instabilidade climática. Isso já é uma realidade. O maior exemplo foi a seca que afetou o escoamento da zona franca de Manaus, no ano passado, durante a Black Friday, ao mesmo tempo em que enchentes interromperam portos em Santa Catarina. Os operadores logísticos precisam levar esses fatores em conta, se antever às situações e se preparar para esses momentos de forma a minimizar os impactos à comunidade e à economia. O Tecon Vila do Conde, por exemplo, acabou exercendo importante papel no apoio às empresas de navegação com dificuldade de trafegar pelo rio Amazonas no ano passado. O terminal passou a ser ponto de parada de parte dos navios de cabotagem e longo curso com destino a Manaus e que precisavam reduzir peso. A carga era descarregada na Santos Brasil e embarcada em barcaças, que têm pouca restrição de navegação. Para este ano, vamos atuar preventivamente na região e de maneira mais estratégica e menos emergencial.
Como a companhia incorpora os conceitos de ESG e parcerias como a comunidade local em sua rotina além do aspeto ambiental?
A nossa estratégia de crescimento tem o ser humano e o meio ambiente como partes integrantes e drivers para a geração de valor equilibrada para os nossos acionistas e para a sociedade. Buscamos ser cada vez mais eficientes, inovadores e atuar de modo alinhado às melhores práticas ESG.
Na área ambiental, nosso foco é neutralizar as emissões de carbono até 2040. Para isso, estamos mudando gradativamente a matriz energética dos nossos equipamentos do diesel para a eletricidade e compensando as emissões de GEE de escopo II por meio da compra de I-RECs. Todos os nossos novos investimentos da Companhia estão alinhados com essa agenda ambiental e contemplam a eletrificação de equipamentos e a utilização de combustíveis renováveis. No ano passado, antecipamos o atingimento das três metas ambientais estabelecidas em 2020, com a redução de 50% a geração de resíduos, de 41% no consumo de água e de 36% nas emissões de gases de efeito estufa.
Já na frente social, estamos muito presentes nas comunidades do entorno de nossas operações. Estruturamos e apoiamos iniciativas de inclusão social com o objetivo de ampliar as oportunidades de acesso à educação, cultura e esporte, para promoção da cidadania e desenvolvimento local. Entre 2022 e 2023 investimos em 54 projetos por meio das leis de incentivo, que beneficiaram 90 mil pessoas no entorno das nossas unidades, especialmente jovens e grupos vulneráveis.