Renata Isfer, ABiogás: 'É essencial integrar o biometano nas políticas de energia renovável e garantir que ele seja parte das metas de descarbonização '

Presidente-executiva da Associação Brasileira do Biogás avalia a expansão e potencial de crescimento do setor.

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Renata Isfer, presidente da ABiogás. (Foto: Divulgação)

Para facilitar e agilizar a tomada de decisões dos investidores, a Associação Brasileira do Biogás e Biometano (ABiogás), em parceria com o escritório de advocacia Faveret, Tepedino, lançou no início de agosto, o Mapeamento Regulatório de Biogás e Biometano. A ferramenta inédita foi desenvolvida para simplificar o acesso às informações regulatórias do setor, tornando fácil a busca por dispositivos legais e regulatórios relacionados ao biogás e biometano em nível federal e estadual.

"Para quem deseja investir em biogás e biometano, é fundamental compreender como funciona a regulamentação federal e a regulação do estado onde se pretende realizar o investimento ", explica Renata Isfer, presidente da ABiogás.

Com uma trajetória de destaque no setor energético, a executiva foi Secretária de Petróleo, Gás e Biocombustíveis no Ministério de Minas e Energia (2019-2020) e tem mais de 15 anos de experiência como procuradora da Advocacia Geral da União (AGU). Mestre em  Direito, Políticas Públicas e Desenvolvimento Econômico, Renata também é cocriadora de iniciativas importantes voltadas para a equidade de gênero e empoderamento feminino no segmento, como o projeto “Sim, elas existem” e o programa de mentoria EmpodereC.

Nesta entrevista, a presidente da ABiogás  fala sobre sua atuação à frente da Associação, trabalho que visa promover o biogás como peça fundamental na transição energética e no combate às mudanças climáticas no Brasil.

Quais são as expectativas da Abiogás para o setor neste ano?

A expectativa da ABiogás para 2024 é bastante positiva. Acreditamos que a aprovação do projeto de lei do Combustível do Futuro é um marco histórico para o Brasil. Essa lei, que agora aguarda a sanção presidencial, estabelece diretrizes que vão acelerar a produção e o uso de combustíveis renováveis e de baixo carbono, como o biometano. Destacamos, entre as medidas, a criação do Programa de Descarbonização do Setor de Gás Natural e o certificado de garantia de origem do biometano, fundamentais para fortalecer o mercado e reduzir nossa dependência de combustíveis fósseis, além de posicionar o Brasil como líder global em energias renováveis.

Além disso, esperamos avanços em políticas públicas e marcos regulatórios que valorizem os atributos do biogás e do biometano. Um exemplo importante é a reforma tributária, em discussão no Senado, que traz uma grande oportunidade para garantir a competitividade dos biocombustíveis em relação aos combustíveis de origem fóssil no Brasil.

Existem gargalos em relação a infraestrutura e distribuição do produto?

A infraestrutura ainda representa um desafio para a expansão do biometano, especialmente no que diz respeito à logística e à integração com a rede de gás natural. O transporte do biometano enfrenta obstáculos, como a carência de uma rede de gasodutos bem estruturada e os altos custos associados ao transporte por caminhões. Para isso, são necessários avanços regulatórios que auxiliem na melhoria da logística e na integração com a rede de gás natural.

No que se refere ao abastecimento de transporte pesado, é essencial aumentar a quantidade de postos de abastecimento (corredores sustentáveis) para GNV/biometano, que é um ponto crucial para viabilizar a ampliação do uso desse combustível em modais rodoviários.

O que falta para a produção de biometano ganhar novos patamares?

Para a produção ganhar novos patamares é essencial integrar o biometano nas políticas de energia renovável e garantir que ele seja parte das metas de descarbonização de setores estratégicos, como o transporte pesado e a indústria. Para isso, é necessário considerar todos seus atributos, que vem desde a eliminação de um problema ambiental, que é a destinação de resíduos, até sua transformação em um energético, com potencial de evitar mais de 642 milhões de toneladas de CO2 que iriam poluir a atmosfera.

Além disso, ainda é necessário aperfeiçoamento em questões regulatórias que ainda esbarram nesse novo mercado e que precisam de atualizações, de forma a possibilitar ainda mais a ampliação do uso desse energético.

O biogás tem sido apontado como uma importante alternativa no atual processo de transformação energética. Qual a sua avaliação sobre a expansão da sua demanda e potencial do ponto de vista das empresas do setor?

Diante da crescente busca por soluções sustentáveis em diversos setores, o biogás surge como uma alternativa de destaque para a descarbonização, com ampla diversidade de aplicações. Na geração de energia elétrica, ele proporciona uma fonte de energia que contribui para a segurança e flexibilidade do sistema. Quando convertido em biometano, um gás renovável, o biogás se torna uma opção estratégica para reduzir emissões em setores críticos, como a indústria e o transporte. Além disso, o biometano pode ser utilizado em uma variedade de aplicações, como a produção de hidrogênio renovável, combustível sustentável de aviação, e outros energéticos alinhados a estratégias de descarbonização.

Em relação à capacidade de produção para atender essa demanda, o Brasil atualmente conta com 1.365 plantas de biogás, que somam mais de 11 milhões de metros cúbicos diários, sendo parte desse volume destinado à produção de biometano. Até 2029, mapeamos, entre os associados da ABiogás, a entrada em operação de 98 plantas de biometano, considerando os projetos autorizados pela ANP e os já anunciados. Esses novos projetos devem acrescentar cerca de 6,8 milhões de metros cúbicos diários de biometano. Portanto, o setor tende a continuar em expansão para atender o mercado. Com o avanço das políticas públicas e o aprimoramento dos instrumentos regulatórios, o Brasil tem o potencial de alcançar, até o final da década, mais de 34 milhões de metros cúbicos por dia de biometano.

Qual é o papel da Abiogás neste cenário de ações contra as mudanças climáticas?

A ABiogás desempenha um papel fundamental como facilitadora do diálogo entre o setor privado e o governo, promovendo e incentivando políticas que ampliem o uso de biogás e biometano no Brasil. Nossa missão é demonstrar os benefícios que o biogás oferece ao sistema energético, especialmente no contexto das metas de descarbonização assumidas pelo país, e identificar os aprimoramentos necessários para que esse mercado seja devidamente reconhecido e impulsionado.

Atuamos em todas as esferas — federal, estadual e municipal — sempre buscando o aperfeiçoamento legislativo e regulatório. Nosso objetivo é garantir o reconhecimento do biogás e do biometano como combustíveis essenciais para a transição energética, contribuindo de forma eficaz para a redução das emissões de gases de efeito estufa.

Qual deve ser o papel do Governo neste momento para valorizar o setor e atrair novos investimentos internacionais?

A criação de um ambiente regulatório mais estável e previsível é essencial para dar confiança aos investidores. Além disso, a definição de metas de longo prazo para o uso de biogás e biometano, associadas a mecanismos de incentivos ao setor para a construção de infraestrutura, pode ser um ponto de atração de capital externo.

A cooperação entre o governo e o setor privado em projetos de grande escala, como a expansão de corredores de transporte de baixo carbono, integração do biometano à rede de distribuição de gás, seria outro ponto chave para criar um mercado mais dinâmico e atrativo. Por fim, promover o biogás e o biometano como soluções para a transição energética, especialmente em fóruns internacionais, pode posicionar o Brasil como um líder global na área de energias renováveis.