"Do autosserviço para o home center inteligente. Essa é a grande revolução que estamos nos propondo a fazer", diz Juliano Ohta

CEO da Telhanorte Tumelero fala do futuro em construção em entrevista exclusiva à Revista LIDE.

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Juliano Ohta, CEO da Telhanorte Tumelero, fala do futuro em construção. (Foto: Divulgação)

Divisão de varejo do grupo Saint-Gobain no Brasil, que compreende 72 lojas e presença em quatro estado brasileiros: São Paulo, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Paraná, a Telhanorte Tumelero é liderada por Juliano Ohta desde 2017. O executivo está no Grupo há 18 anos e, ao longo desta jornada, acumulou experiência em negócios diversificados e vivência internacional.

Antes de assumir a companhia, o Ohta ocupava a Diretoria Geral da Perfomance Plásticos do Grupo. Antes, atuou como diretor de Compras e Marketing e de Operações da própria Telhanorte. Em sua passagem por mais de oito anos na Europa, foi Head de Controladoria na Point. P, em Madrid, e diretor geral da SFIC, em Paris, ambas da Saint-Gobain.

Formado em Administração de Empresas pela Fundação Getulio Vargas, Juliano Ohta possui mestrado pela Ecole Supérieure de Commerce (ESCP), na França. Além disso, fez sua pós-graduação em General Management Program pela Harvard Business School, nos Estados Unidos. Atualmente, ele é membro do conselho do Instituto para o Desenvolvimento do Varejo (IDV), sendo responsável pelo comitê de Pessoas e Sustentabilidade.

Nesta entrevista, o CEO detalha o impacto da pandemia de Covid-19 no dia a dia das lojas da Telhanorte, fala sobre as tendências de transformação do setor do ponto de vista tecnológico e ainda indica quais são as metas da companhia para os próximos 15 anos.

REVISTA LIDE: De forma geral, quais os principais impactos da pandemia do novo coronavírus nas atividades da Telhanorte? Que tipo de movimentação a crise acabou causando na empresa?

Juliano Ohta: O impacto foi grande em toda atividade econômica. A situação exigiu incorporar protocolos rígidos, tanto do ponto de vista de saúde e segurança, quanto no sentido de manter o negócio e proteger o caixa da empresa. Agimos desde o princípio com responsabilidade e equilíbrio com toda a cadeia de valor. Mantivemos 100% dos empregos e priorizamos os pagamentos de fornecedores pequenos.

Posso dizer que a crise potencializou muitas coisas boas que já tínhamos na empresa, como a empatia. Passamos a estar ainda mais próximos dos nossos colaboradores e a ouvir muito mais as dores e necessidades dos nossos clientes. Isso nos levou a acelerar o ritmo de inovações, o espírito de colaboração e a capacidade de fazer muito mais com menos.

Vocês deixaram de focar em algum segmento ou redefiniram alguma linha de atuação?

Não deixamos de focar em segmentos específicos, pois as necessidades continuam existindo. Nas primeiras semanas de isolamento, notamos uma procura maior por produtos de reparos e manutenção, e na sequência veio um movimento forte por decoração e organização da casa. A propósito, apostamos nessa tendência, já que muitas pessoas continuarão em home office e devem investir mais em melhorias no lar.

Do ponto de vista de serviços, esse sim foi o grande foco da nossa atuação. Ficou claro que não somos apenas uma rede varejista, mas sim um solucionador de problemas que entrega a solução completa para o cliente. Nós implementamos o sistema de drive thru e retirada nas lojas, passamos a fazer entregas rápidas, abonamos fretes para profissionais da saúde e pessoas acima de 60 anos, transformamos um caminhão em loja itinerante com produtos a preço de custo que vai até o consumidor, entre outros serviços.

Com o grande interesse das pessoas em fazer melhorias em suas casas, e o crescimento da cultura do “faça você mesmo”, de que forma a Telhanorte pretende avançar nessa área?

O movimento do faça você mesmo cresceu, sobretudo por conta das restrições de contato. Isso nos motivou, por exemplo, a criar os serviços específicos que mencionei. Muitas pessoas pegaram confiança e viram que é possível fazer pequenas reparos em casa. Digo que foi um movimento parecido com o que houve com o e-commerce, em que mesmo quem tinha receio de comprar pela Internet passou a fazê-lo. Vejo que esses dois comportamentos vão continuar em alta. Entretanto, é importante observar que a cultura de serviços está enraizada no País. Historicamente, o brasileiro tem por hábito terceirizar muitas atividades. Por isso nossa meta é continuar ofertando o maior número de serviços possíveis dentro da nossa realidade de mercado. Quanto mais ofertas neste sentido, seja de forma direta ou por meio de parceiros, levaremos mais conveniência ao consumidor e certamente o fidelizaremos.

Os conceitos de “moradia” mudam de tempos em tempos e de geração para geração. Qual a dificuldade de formatar um mix de produtos, serviços e planejar a comunicação dentro de um universo tão grande de gêneros, idades, necessidades e profissionais?

Pesquisas apontam, por exemplo, que os Millennials preferem alugar imóveis a comprá-los, então acabam comprando mais itens de decoração do que reforma. Por outro lado, a casa ainda é o santuário das Gerações X e anteriores, o que faz com que investir em melhorias seja algo recorrente.

O grande desafio é conseguir identificar esses diferentes perfis de consumidores antes mesmo de uma jornada de compra. Daí a importância do uso de dados, para saber com quem estamos falando, quais produtos e serviços devemos oferecer e como será nossa interação com esse potencial cliente. A chave é personalizar a relação e a comunicação, sendo o mais assertivo possível no conteúdo, no meio e no timing.

Quais as perspectivas de ampliação e investimento para as lojas de bairro conhecidas como Telhanorte Já. Esse tipo de comércio chega a ser uma concorrência significativa?

Primeiro, gostaria de dizer que sou um admirador deste tipo de comércio, em que o dono da loja conhece o cliente pelo nome e sabe muito bem das necessidades de consumo daquele bairro. No Brasil, estima-se em mais de 180 mil pontos de vendas de materiais de construção nesse formato. Essa força do comércio de proximidade foi o que nos levou a ser o primeiro home center a investir neste modelo de loja. Identificamos que há um perfil de cliente que prefere comodidade e conveniência. Embora as lojas sejam pequenas, podemos vender 100% da nossa gama de produtos por meio do que chamamos de prateleira infinita. Há ainda uma série de serviços que esse modelo oferece, que atraem não apenas o consumidor prático, mas também profissionais que estão envolvidos em obras na região e zeladores de condomínios. Vamos inaugurar mais quatro lojas deste modelo em 2020 e algumas dezenas no médio prazo.

Autosserviço em lojas de materiais de construção foi uma grande revolução no segmento. O que podemos enxergar como futuros diferenciais no atendimento em loja ou mesmo no ambiente digital par aos próximos anos?

Do autosserviço para o home center inteligente. Essa é a grande revolução que estamos nos propondo a fazer no segmento. O que isso significa? Ser o companheiro do cliente em todo o seu processo de obra, e não apenas na jornada de compra. Isso passa, por exemplo, por atender sua demanda de forma eficiente em qualquer que seja o canal. O processo de obra é complexo e investe-se tempo e dinheiro. Então entendemos que, quanto mais resolvedores de problemas do cliente nós formos ao longo deste período, mais fidelizado ele será. Em algum momento a interação será pelo digital, em outra fase nas lojas físicas. A empresa tem de se adaptar ao timing e a demanda do cliente.

Os avanços e implantação dos meios de pagamento disruptivos ocupam um lugar de destaque no varejo. Como a Telhanorte tem avançado nesse campo?

É importante lembrar que os meios de financiamento são extremamente importantes para o setor de materiais de construção. Tanto que mantemos há mais de 13 anos uma joint venture com um banco para possibilitar ao cliente pagar a prazo gratuitamente ou com custo baixo por meio do nosso cartão.

Agora, do ponto de vista de meios de pagamento disruptivos, eles tendem a ocupar cada vez mais destaque no varejo. Primeiro porque certos métodos, como QR Code e cartão por aproximação, eliminam contato. E segundo porque será uma demanda cada vez maior do consumidor. Adotar esses meios de pagamento disruptivos é parte integrante da jornada de fidelização do cliente.

Existe alguma dificuldade de digitalizar as vendas no setor?

No setor de materiais de construção, dificilmente a jornada será 100% digital, pois uma obra passa por diversas fases e envolve terceiros, exigindo um modelo híbrido físico e digital. Nosso grande desafio é estar preparado para dar ao cliente o poder de escolha de seguir com a sua jornada totalmente virtual ou não.

O que temos feito é levar para o ambiente digital alguns serviços e ferramentas de interação para quem prefere fazer a distância. Por exemplo, pelo site nosso cliente consegue montar a planta de um ambiente em 3D com ajuda de profissionais. Também criamos um serviço que o auxilia a realizar instalações por meio de vídeo chamada. Vale observar que nosso e-commerce já representa quase dois dígitos do faturamento, que é um percentual muito superior ao que se registra em varejistas na Europa, por exemplo.

Quais são as principais metas da Telhanorte para os próximos anos, como imagina a companhia nos próximos 15 anos?

Vejo a Telhanorte Tumelero como protagonista deste movimento de home center inteligente. Queremos ser considerados pelo cliente o parceiro que vai solucionar todos os problemas relacionados à reforma, construção, organização e decoração de sua casa. Uma rede com mais tecnologia, múltiplos canais, formatos diferentes e com uma fluidez grande na operação, muito mais focada em serviço. O cuidado com as pessoas continuará sendo nossa prioridade.

De que forma sua experiência agrega em sua gestão à frente da Telhanorte? Qual foi a principal mudança na estratégia da empresa implantada por você?

Tenho um profundo conhecimento de varejo, vivência em diferentes culturas e atuação em múltiplas áreas. Nos últimos 20 anos, tive o privilégio de ter trabalhado em quatro países e ocupado posições em praticamente todas as áreas de uma empresa: logística, finanças, compras, qualidade, operação, controladoria, marketing. Ao longo da minha carreira, passei por algumas disrupções, o que ajudam a conviver num cenário de varejo em extrema transformação.

Desde que assumi a posição de CEO da Telhanorte Tumelero, tenho liderado muitas mudanças: de cultura organizacional, passando por uma nova e diversa equipe, tanto de idade quanto de gênero, além de mais autônoma e empoderada; novo posicionamento da empresa, com maior foco no cliente, isto é, ser o home center inteligente e dedicado à solução completa; e a implementação de novos canais e modelos de negócios, como a Telhanorte Já e o modelo de atacarejo que será lançado em breve.