Onde estão as mulheres conselheiras de administração?

Nós, mulheres, representamos quase 52% da população brasileira e somos as mães dos outros 48%, e ainda assim, nossa presença nas posições de poder se resume a apenas 17%.

Neívia Justa_Membro do Conselho Consultivo do 30% Club Brazil_Crédito  DivulgaçãoNeivia Justa, Membro do Conselho Consultivo do 30% Club Brazil. (Foto: Divulgação)

Nós, mulheres, representamos quase 52% da população brasileira e somos as mães dos outros 48%. Somos maioria nas universidades, tanto na graduação quanto na pós graduação. Trabalhamos em todos os setores da economia, todavia, nossa presença nas posições de poder e alta liderança nas empresas e conselhos de administração, sejam eles de origem privada ou pública, ainda se resume a apenas 17% de acordo com a mais recente pesquisa “Panorama Mulheres 2023” feita pelo Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper) e pelo Talenses Group.

Para entender as origens dessa disparidade, é fundamental retrocedermos um pouco na história e na cultura patriarcal e machista em que fomos forjados.

Apenas em 1879 as mulheres conseguiram permissão do governo para entrar na faculdade. Todavia, as solteiras deveriam apresentar a licença dos seus pais, e as casadas, autorização por escrito de seus maridos. Isso fazia com que o número de mulheres que chegavam ao ensino superior fosse muito baixo. Além de todo preconceito da sociedade, elas não frequentavam cursos preparatórios, o que dificultava ainda mais seu ingresso na faculdade.

Na década de 1950 e 1960, e de modo marcante até o final do século XX, nosso acesso à universidade e à diversificação dos campos de trabalho foi paulatinamente se ampliando. Até 1962, as mulheres casadas só podiam trabalhar fora se o marido permitisse, além da possibilidade da autorização ser revogada a qualquer momento. Nos anos 1970, os conselhos empresariais começaram a se popularizar no Brasil, atendendo a necessidade de conciliar os interesses dos acionistas aos da gestão. Aos poucos, muito mais lentamente do que o necessário, por uma crescente pressão do mercado, esse contexto vem mudando. Em 2018, tínhamos 9,4% de mulheres em conselhos de administração; em 2019, 10,5%; em 2020, 11,5% e, em 2021, 14,3%, de acordo com a segunda edição da pesquisa “Análise da participação das mulheres em conselhos e diretorias das empresas de capital aberto” do IBGC (Instituto Brasileiro de Governança Corporativa).

A própria B3 lançou, em agosto de 2023, o IDIVERSA, primeiro índice latino-americano a combinar critérios de gênero e raça para selecionar as empresas que irão compor a carteira. Este indicador reconhecerá as companhias listadas que se destacam em diversidade, além de promover maior representatividade de grupos sub-representados (gênero feminino, pessoas negras e indígenas) no mercado.

Os dados de uma pesquisa de 2023, intitulada “Liderança Empresarial: Um estudo sobre CEOs e Conselhos de Administração”, realizada pela Vila Nova Partners e Drixx ITAdvisors indica que em relação a gênero, 78% são homens, 19%, mulheres, 1%, outros, e 3% preferiram não responder. Entre os presidentes de conselhos das 83 empresas analisadas, somente 5 são mulheres (6%).

Apesar dos dados inquietantes, há mais mulheres em conselhos hoje do que em 2021 (15%). Entre todos os grupos analisados, 92% apresentam ao menos uma mulher -eram 80% em 2021 - e 27% têm três ou mais mulheres. E isso se deve em grande medida à articulação de iniciativas e movimentos, assim como programas de formação de mulheres conselheiras.

Entre eles está, na área privada, o 30% Club, campanha global que visa aumentar a equidade de gênero no conselho e na alta administração das companhias listadas em bolsa.

Na área pública temos o PL 1246/2021 que criou cota obrigatória mínima de 30% de participação de mulheres em conselhos de administração de companhias abertas, de empresas públicas, de sociedades de economia mista e outras companhias em que União, Estado ou Município sejam controladores.

Todavia, apesar de todas essas iniciativas, se fizermos uma conta básica, perceberemos que nós, mulheres, ainda ocupamos apenas 1/6 dos cerca de 5 mil assentos e, a cada renovação de aproximadamente 100 postos nos conselhos, ficamos com menos de 1/3 deles. Nesse ritmo, considerando todos os vieses e pré-requisitos que já relatamos aqui, para zerar essa desigualdade temos que acelerar o passo e agir em bloco para que, ainda neste século, não tenhamos mais que perguntar: “onde estão as mulheres dos conselhos de administração?”.