Roberta Tedesco: Reimaginando o espaço de trabalho pós-pandemia

Especialista traz uma avaliação e as principais tendências dentro dos modelos oferecidos para realizar as rotinas.


Roberta Tedesco, sócia de estratégia em finanças corporativas do setor de real Estate da EY. (Foto: Divulgação/Agência EY)


As adaptações na rotina de trabalho durante a pandemia trouxeram muitos questionamentos e incertezas sobre o tão falado “novo normal”. A adoção de medidas inovadoras nos escritórios, que antes eram planejadas de acordo com o crescimento das empresas e até mesmo do país, foram aceleradas e impulsionadas durante esse período. A implantação de serviços tecnológicos, que antes eram priorizados por startups e empresas com maior número de colaboradores da geração Z, cresceu exponencialmente para adequar as necessidades low touch. Mesmo com essa aceleração de novos modelos e tecnologias, o futuro dos espaços de trabalho precisa ser repensado e moldado para cada empresa de forma heterogênea.  

A crise pandêmica nos fez agir imediatamente para trazer soluções que possibilitassem o convívio mínimo necessário nos escritórios, até chegar ao momento de home office integral. No início, essas soluções foram enxergadas como temporárias, mas, aos poucos, elas foram se solidificando e criando outros modelos de espaço de trabalho. Podemos destacar, ao menos, três modelos mais comuns: 

Remoto – neste modelo, o colaborador trabalha integralmente fora do escritório, normalmente em ambiente residencial. O modelo que para muitos ainda era tabu antes da pandemia, hoje já tem muita aceitação, fazendo inclusive com que muitas empresas adotem o conceito de WFH (work from home) permanentemente. 

Híbrido – um dos modelos mais buscados atualmente é o modelo híbrido, que permite ao colaborador trabalhar alguns dias por semana no escritório e o restante a distância. 

Presencial – o modelo presencial era o mais comum antes da pandemia, no qual o trabalho era realizado integralmente no escritório. 

A partir desses três modelos, já é possível observar novas ramificações em desenvolvimento, e não somente focadas no conceito de WFA (work from anywhere – trabalhar de qualquer lugar), tais como o modelo flexível, que permite maior liberdade de horário e foca no resultado entregue; ou o modelo hub (ou spoke), que apresenta pequenos escritórios descentralizados, permitindo ao colaborador escolher a localização disponível mais conveniente; ou ainda o modelo remoto plus, em que o escritório é utilizado uma semana ao mês e as três semanas seguintes são de trabalho remoto. 

Além dos novos modelos de trabalho, a pandemia acelerou também as adaptações no ambiente corporativo, fortalecendo o conceito do Workplace of the Future como uma oportunidade de transformação e otimização dos escritórios. O conceito, que já era conhecido anteriormente por alguns, remete a visão do escritório como um espaço de networking e colaboração e não mais somente para trabalho individual.  

Os espaços de trabalho estão sendo reorganizados a fim não somente de atender às normas sanitárias, mas também para atender às novas tendências/benefícios enxergados durante a pandemia. A arquitetura corporativa se adaptou para receber áreas com maior distanciamento entre as mesas de trabalho e, ao mesmo tempo, áreas mais colaborativas, buscando estimular o convívio social que muitos sentiram falta nos últimos meses.  

A crescente tendência dos espaços colaborativos já existia antes pandemia, entretanto, antes estava fortemente relacionada ao conceito de escritório open space. Hoje, vemos esses espaços sendo implantados em diversos formatos, não somente nas áreas abertas do escritório, mas também em salas fechadas de vários tamanhos e capacidade, e ainda com diversos tipos de tecnologias implantadas a fim de fomentar e auxiliar a colaboração entre as equipes de trabalho.  

As phone booths são um bom exemplo dessa diversificação, pois normalmente são salas para no máximo três pessoas e possuem tecnologia para vídeo chamada, possibilitando não somente a colaboração presencial, mas também à distância. Essas variações permitem maior aderência ao uso dos espaços, abrangendo as mais diversas realidades das rotinas de cada escritório e de cada colaborador. Em alguns casos, este mesmo espaço pode ser unificado com uma ou mais salas ao lado e, ao reorganizar o leiaute do mobiliário, se tornar um lugar de reunião de modelo mais clássico, um formato de auditório ou ainda com formato mais despojado para momentos de descompressão e brainstorming.  

A forte tendência de flexibilidade da arquitetura e dos mobiliários permite uma infinidade de combinações e estímulos, expandindo ainda mais a colaboração entre equipes. A definição das melhores adaptações, seja no modelo ou no espaço de trabalho, deve ser feita de forma singular para cada empresa e baseada nas diferentes culturas e necessidades de cada uma. 

Apesar desse impulsionamento para o retorno ao escritório em busca de integração e colaboração, a necessidade de networking e troca de ideias não são os únicos atrativos para a ida até o escritório. A necessidade de momentos de foco, sem interferências, também é um estímulo que se tornou comum, em que os espaços de trabalho tradicionais, com mesas e cadeiras ergonômicas em áreas de concentração também são desejados, já que, em muitos casos, o colaborador não consegue encontrar tais condições em casa, seja devido a ruídos externos ou à interligação com a rotina de outros membros da família.  

Assim, apesar dos questionamentos sobre a necessidade, a continuidade dos escritórios e a aderência ao home office, vemos que a busca pelo modelo tradicional, ou até mesmo o híbrido, são também desejados pelos colaboradores. A ressignificação do ambiente de trabalho e o conceito de “trabalhar de qualquer lugar” trouxeram impactos positivos como o aprendizado do trabalho a distância, quebrando as barreiras físicas entre as pessoas, mas também trouxeram um sentimento de falta de interações e integrações de equipe que reforçam a cultura da empresa e de espaços de concentração apropriados.  

Desta forma, observa-se um refortalecimento do mercado imobiliário corporativo e, até mesmo, um movimento em que diversos “landlords” passam a considerar a realização de obras de retrofits em seus edifícios monousuários, a fim de adaptá-los para atender a mais de um locatário. Isto porque, dentre as certezas que a pandemia trouxe, foi a de que não necessitamos do mesmo espaço, em dimensão, como era antes. 

Por fim, outro fator intrínseco na implantação das adaptações é a busca pelos princípios universais de ESG (Environmental, Social and Governance), derivados da Declaração Universal de Direitos Humanos, da Declaração da Organização Internacional do Trabalho sobre Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho, da Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento e da Convenção das Nações Unidas Contra a Corrupção, e que contribuem para o alcance dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU. Tais princípios de sustentabilidade empresarial estão, inclusive, integrados entre si e entre os novos modelos citados e induzem aos mesmos resultados esperados com a adaptação.  

Com a adoção do modelo híbrido, por exemplo, temos a possibilidade de atingir ao menos dois targets de ESG por meio da integração social nos dias de trabalho no escritório, considerando também a individualidade de cada funcionário e, ao menos tempo, reduzir o impacto ambiental, já que há diminuição da emissão de poluição por meio do deslocamento diário entre a residência e o escritório.  

Além disso, o futuro dos escritórios também está conectado às premissas de redução de emissão de carbono, já que traz mais consciência à utilização dos espaços. Embora não haja uma métrica ou certificação, o que percebemos é que as decisões de mudanças corporativas estão cada dia mais integradas com os conceitos de ESG e funcionam como medidas corretivas e preventivas.

Fonte: Agência EY