Ampliação de embarques a mais destinos ajudou a conter redução de superávit comercial em 2024, aponta Lia Valls

Mesmo com redução do resultado em relação ao ano anterior, o resultado do ano passado ainda é o segundo maior da série histórica iniciada em 1997.

Lia Valls, pesquisadora associada do FGV IBRELia Valls, pesquisadora associada do FGV IBRE. (Foto: Reprodução/FGV IBRE)

Nesta semana, a Secretaria de Comércio Exterior (Secex/Mdic) divulgou que o superávit comercial brasileiro em 2024 foi de US$ 74,6 bilhões, 24,6% menor do que o número recorde de 2023, de US$ 98,9 bilhões. Os principais fatores para essa diminuição foram a queda no preço das commodities, afetando o valor, e um aumento das importações de 9%, no qual se destaca o segmento de bens de capital com maior aumento de volume importado (25,6%) – positivo para a ampliação da atividade –, e o terceiro lugar em participação em termos de valor (13,6% do total), atrás de bens de consumo (15,4%) e bens intermediários (59,5%).

Mesmo com redução em relação ao ano anterior, o resultado do ano passado ainda é o segundo maior da série histórica iniciada em 1997. A corrente de comércio também foi a segunda maior, com US$ 599,5 bilhões. Lia Valls, pesquisadora associada do FGV IBRE, destaca que a significativa redução do superávit com a China, maior parceiro comercial brasileiro, foi em parte equilibrada com a melhora de resultado para outros destinos. Em relação a 2023, o superávit no comércio com a China caiu US$ 20,6 bilhões, para US$ 30,8 bi.

“Outra queda que também chama a atenção é no comércio com a Argentina, principal parceiro comercial na América do Sul, cujo superávit caiu de US$ 4,7 bilhões em 2023 para US$ 200 milhões este ano”, comenta. A pesquisadora também destaca a estabilidade no superávit com a Associação de Nações do Sudeste Asiático (Asean), que foi de US$ 15 bilhões, destino onde se destacaram as vendas de carnes e óleo combustível. “Também é preciso olhar para a significativa redução do déficit comercial com os Estados Unidos, que em 2023 foi da ordem de US$ 1 bilhão, caindo para US$ 253 milhões no ano passado”, diz.

Para 2025, o cenário de incertezas alimentado pela direção que a política externa de Trump tomará dificulta a projeção de resultados. Na divulgação da balança, a Secex divulgou uma estimativa dentro de um intervalo amplo, entre US$ 60 bilhões e US$ 80 bilhões, afirmando esperar o primeiro trimestre para apontar uma projeção mais apurada.

Valls destaca que, a depender da direção que o governo Trump tome no campo externo, pode haver redução na demanda mundial, com impacto negativo, por exemplo, no preço de commodities exportadas pelo Brasil. Quanto à possibilidade de o país ser diretamente afetado por aumento de alíquotas de importação aos Estados Unidos – o que afetaria a tendência de melhora nas trocas comerciais com o país – Tatiana Prazeres, secretária de Comércio Exterior do MDIC, destacou que o Brasil representa o sexto maior superávit dos Estados Unidos em seu comércio internacional, o que inicialmente pode deixar o país de fora da estratégia americana de proteção comercial via tarifas.

“Há um forte vínculo empresarial entre Brasil e Estados Unidos, envolvendo comércio intrafirma. Para nenhum outro mercado há tantas empresas brasileiras exportadoras”, citou, o que também deveria ser motivo para poupar o país de uma ação direta, ainda que o recrudescimento de medidas protecionistas tenda a prejudicar o comércio global como um todo.

Quando à escalada do dólar para o nível de R$ 6, Valls reconhece que pode favorecer alguns setores exportadores, mas lembra que esse efeito não é imediato – “nosso setor manufatureiro, por exemplo, ainda depende muito da demanda argentina” –, e o que vale para os empresários é o câmbio real, não nominal. Ou seja, com inflação alta, o ganho real pode ser reduzido. “Tampouco interessa um câmbio muito volátil. Comércio exterior depende de contratos, e por mais que se tenha hedge, é preciso um mínimo de previsibilidade”, afirma.