Lei de Arbitragem completa 28 anos em meio a transformação digital
A arbitragem, método alternativo ao Poder Judiciário, tem ganhado cada vez mais espaço como opção para empresas e a administração pública.
Daniel Gontijo, presidente da câmara Arbitralis. (Foto: Divulgação)
Com 28 anos marcados nesta segunda-feira (23), a Lei de Arbitragem (Lei 9.307/1996) consolidou câmaras de arbitragem como opções céleres, confidenciais, com árbitros altamente especializados e seguras para resolução de disputas.
Agora, a arbitragem vive novas oportunidades possibilitadas pela transformação digital, como a aplicação deste instituto privado a processos de alto volume e menor complexidade, ainda majoritariamente dirimidos em tribunais estatais, e, como contraponto, a adoção mais frequente da prática arbitral em disputas complexas e internacionais.
Segundo Daniel Gontijo, presidente da câmara Arbitralis, “a transformação digital tem impactado profundamente a arbitragem no Brasil, trazendo inovações que aumentam a eficiência e acessibilidade do processo. A incorporação de tecnologias como videoconferências, gestão de documentos eletrônicos e plataformas digitais para a condução de todo o processo tem permitido que a arbitragem se torne mais rápida e menos onerosa para a sociedade. Essas tecnologias facilitam a participação de partes e árbitros de diferentes localidades, eliminando barreiras geográficas e reduzindo custos relacionados a deslocamentos e infraestrutura física”.
Martim Della Valle, sócio do escritório Marchini, Botelho e Caselta Advogados. (Foto: Divulgação)
De acordo com o advogado Martim Della Valle, sócio do escritório Marchini, Botelho e Caselta Advogados, “hoje é perfeitamente possível conduzir um caso internacional de arbitragem sem a necessidade de nenhum deslocamento. Além disso, há cada vez mais dados disponíveis, o que torna a arbitragem mais transparente, facilitando as decisões estratégicas das partes e advogados. Softwares de gestão de documentos também facilitam muito a condução de casos que envolvem grande quantidade de provas, como é o caso das arbitragens envolvendo grandes obras”.
Fernando Breda, sócio do escritório Araúz Advogados. (Foto: Divulgação)
Segundo o advogado Fernando Breda, sócio do escritório Araúz Advogados, “por encontrar sua legitimidade na vontade das partes, a Arbitragem inegavelmente tem se mostrado como sendo a porta de entrada para uma transformação digital e a implementação de novas tecnologias visando um melhor acesso à Justiça, o que foi demonstrado cabalmente durante a pandemia de covid-19. Para a implementação de uma nova tecnologia em um procedimento arbitral, basta a vontade das partes envolvidas para assim fazer, não necessitando de qualquer modificação de legislação ou autorização superior. Assim, preserva-se a sua dinâmica e celeridade e evita que fique defasada enquanto método de resolução de disputas”.
Conhecimento sustentará popularização da Arbitragem
Especialistas apontam questões culturais como a principal barreira a ser superada para empresas escolherem ainda mais a arbitragem como método de resolução de disputas. “Tradicionalmente, o meio jurídico brasileiro é baseado em procedimentos judiciais, e muitos profissionais e empresas estão mais acostumados a recorrer aos Tribunais para a resolução de disputas. Essa preferência pelo Poder Judiciário pode ser atribuída à familiaridade com a prática já existente e à percepção de que a arbitragem pode não oferecer o mesmo nível de segurança e validade jurídica, apesar de não ser verdade. Além disso, há uma percepção de que a arbitragem pode ser cara, o que também não é absolutamente verdade”, explica o presidente da Arbitralis, Daniel Gontijo.
Segundo Fernando Breda, do Araúz Advogados, a resistência das partes sobre a arbitragem ainda existe, “de uma forma infinitamente menor do que era anos atrás, e só pode ser justificada por um desconhecimento sobre o real funcionamento do instituto. Por ser um mecanismo embasado na liberdade das partes, um procedimento arbitral pode ser perfeitamente construído e ajustado de acordo com as necessidades das partes envolvidas e as particularidades do litígio. Em regra, nada é imposto na arbitragem, nem mesmo a sua adesão. Só há arbitragem quando as partes assim convencionarem”.
Na mesma linha, Martim Della Valle, do Marchini, Botelho e Caselta Advogados, percebe que as pessoas em geral apontam custos e falta de transparência como motivos para resistência. Mas os custos em geral são atrelados ao valor da disputa e não necessariamente são maiores do que os custos no Poder Judiciário, especialmente quando se considera que no Poder Judiciário sempre haverá condenação em honorários advocatícios e quando se considera, também, o tempo de duração de uma disputa.
“Não creio que exista falta de transparência, mas o fato é que cada vez mais há informações públicas sobre casos, árbitros indicados, precedentes em temas importantes, como conflito de interesses e revelação por parte dos árbitros. Por outro lado, nem sempre a arbitragem será o melhor método de solução de uma controvérsia. Há casos que mediação ou mesmo o Poder Judiciário serão escolhas mais acertadas para resolver a disputa. O importante é que as partes possam fazer uma escolha bem-informada sobre o tema e que tenham todas as opções disponíveis”, explica Della Valle.
Quais são suas expectativas para o futuro da Arbitragem?
Daniel Gontijo: A arbitragem continuará a se expandir, especialmente em setores como locação imobiliária, construção civil, energia, tecnologia e relações comerciais internacionais, em que a necessidade de resoluções especializadas e eficientes é particularmente crítica. A tendência é que as empresas e profissionais do Direito busquem cada vez mais implementar cláusulas de arbitragem em seus contratos, além da procura por Câmaras que adotem tecnologias digitais, fortalecendo ainda mais a arbitragem on-line como um meio eficiente de resolver disputas. Isso inclui o uso mais amplo de inteligência artificial para análises preditivas e suporte à decisão, bem como a implementação de medidas de segurança cibernética mais robustas para proteger a integridade dos processos arbitrais.
Fernando Breda: Para os próximos 30 anos, é esperado um amadurecimento ainda maior da comunidade jurídica brasileira na sua utilização, com um natural aprimoramento jurisprudencial na matéria, uma capacitação ainda maior de todos aqueles envolvidos com um procedimento arbitral e a expansão da sua utilização para outras áreas do Direito.
Martim Della Valle: São muito positivas. Hoje a arbitragem é sem dúvida parte importante da prática jurídica brasileira, especialmente no campo empresarial. Já é uma realidade consolidada. Creio que a tendência continuará, agora com um avanço significativo no interior do país.