Izabella Teixeira, da ONU: 'A Amazônia coloca o Brasil no mundo e a Amazônia de hoje tira o Brasil do mundo'

Izabella Teixeira, copresidente do International Resource Panel da ONU, foi uma das expositoras do LIDE Brazil Conference, que ocorreu em Londres.

DSC_1485Izabella Teixeira em exposição no LIDE Brazil Conference, em Londres. (Foto: Felipe Ferugon/LIDE)

Em momento de retomada da política ambiental do Brasil e da tentativa de restaurar a imagem do país internacionalmente - como um espaço essencial para alcançar a segurança climática mundial-, Izabella Teixeira, copresidente do International Resource Panel da ONU e ex-ministra de Meio Ambiente do Brasil, defendeu a segurança climática global a partir da Floresta Amazônica.

A Amazônia coloca o Brasil no mundo e a Amazônia de hoje tira o Brasil do mundo. Do ponto de vista político, não se tem segurança climática sem Amazônia protegida. Sem floresta de pé, sem o Brasil de pé, mas o país vai além da Amazônia e essas soluções devem se estender a todo o país.

Confira a entrevista completa:

Os Estados Unidos anunciaram uma recomendação ao Congresso de entrada com aporte de US$ 500 milhões no Fundo Amazônia. Como a senhora avalia essa iniciativa e a importância do ingresso dos americanos?

São dois sinais importantes, primeiro é uma contribuição importante de como os Estados Unidos toma a decisão de se associarem ao fundo, que foi criado primeiramente com relação Brasil e Noruega e em 2015 com adesão da Alemanha, e agora há uma estratégia do governo em buscar novos parceiros. O fundo tem uma concepção não só de trabalho em investimentos no Brasil, mas também em viabilizar a cooperação internacional de outras bacias tropicais. No momento que se tem a adesão dos EUA, você traz uma configuração importante de mais um membro com envergadura, lembrando da responsabilidade deste país em todo o processo. A própria declaração bilateral com a China mostra que o tema sobre clima não pode estar na disputa da polarização que envolve essas duas superpotências.

O segundo ponto é um recado importante para o Brasil: a comunidade internacional demonstra otimismo, que chamo de pragmático, com o país, entendendo que o fundo deve ser um dos instrumentos que faz o país a trilhar, de maneira mais robusta, a agenda de segurança climática- que passa pela Amazônia de pé e sua proteção. Até porque, um carbono ilegal chega à atmosfera de todo jeito, mas não é um carbono que gera riqueza, mas sim crime e pobreza. Portanto, quando você tem um instrumento como esse (o fundo), que ganha escala, ele pode ser usado com critérios mais abrangentes e ambiciosos de dirigir soluções. Isso quer dizer, você contém o desmatamento e por outro lado busca alternativas econômicas e sociais.

Por isso, vejo como uma sinalização importante, lembrando que os Estados Unidos têm uma participação também no LEAF, outro fundo de florestas tropicais. Essa possível entrada mostra a decisão de vir com o Brasil e trabalhar de maneira mais alinhada e convergente, que reflete em conversa

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Existe um projeto de exploração de petróleo na foz do Rio Amazona. Qual o seu posicionamento?

É um assunto polêmico, e eu sou particularmente a favor que o Brasil não adote essa posição de exploração, até porque temos alternativas para a exploração de petróleo em outras bacias sedimentares. A foz do Amazonas tem uma sensibilidade enorme, do ponto de vista ambiental, visto os dados já divulgados. É óbvio que se a indústria do Petróleo e o Ministério de Energia tem interesse nisso, tem que abrir o debate e ser transparente. Isso não é uma decisão a ser tomada por disputas radicas, o Brasil precisa entender como se toma decisão- se vale a pena o risco associado, que pode ser alto. Como no caso do Parque Nacional Marinho de Abrolhos, que lá trás foi tomada a decisão de não ter exploração, que depois a ideia foi até de ampliar a proteção. No último governo, tentaram oferecer áreas nessa região e ninguém aceitou, isso por conta do risco alto. Acho que o Brasil não precisa disso para trabalhar segurança energética na Amazônia, o governo tem responsabilidade de proporcionar um debate aberto.

Quais medidas o Governo atual tem adotado para combater as mudanças climáticas?

O governo brasileiro tem a dimensão política da agenda climática, tendo-a como prioridade. Não é um comportamento reativo, muito pelo contrário. Outro aspecto é o olhar para a Amazônia de forma estratégica, de entender o papel dos povos originários na conservação, na proteção e na emergência das novas economias verdes da região. Por outro lado, há a decisão de enfrentar o desmatamento, que pelo que se observa, é uma prioridade do governo e não vai ficar só no circuito do Ministério do Meio Ambiente.

É preciso ter uma visão comprometida e transparente de como acabar com o desmatamento, e isso bate na cadeia do crime organizado- um processo enorme e muito caro. Quem desmata são estruturas econômicas muito poderosas e bancadas pela ilegalidade que se conectam com os hubs internacionais do crime organizado. Por isso, precisamos ter uma agenda articulada, com inteligência, tecnologia, visão e, mais do que isso, precisamos, concomitantemente, prover a Amazônia e outras regiões de soluções de desenvolvimento, sem vilanizar a indústria que já está lá, portanto, regular o que a lei permitir.

O Brasil precisa lidar com os seus fantasmas de frente e fazer um grande pacto com a sociedade para que todos estejam comprometidos com a regularização fundiária e a modernização do Marco de Licenciamento Ambiental, dotar de novas capacidades a gestão pública e ambiental para dar respostas tanto na esfera federal quanto subnacional, pois há uma responsabilidade direta dos governadores.

A Amazônia coloca o Brasil no mundo e a Amazônia de hoje tira o Brasil do mundo. Do ponto de vista político, não se tem segurança climática sem Amazônia protegida. Sem floresta de pé, sem o Brasil de pé, mas o país vai além da Amazônia e essas soluções devem se estender a todo o país.