José Rocha: A tecnologia e o país rural

Especialista avalia as perspectivas com a chegada do 5G às regiões campestres do país.

José Ronaldo RochaPor José Rocha, sócio da EY e líder de consultoria para Tecnologia, Mídia & Entretenimento e Telecomunicações (TMT). (Foto: Divulgação)

Até o fim deste semestre, ao menos parte dos brasileiros deverá ter acesso ao que há de mais moderno em termos de internet móvel no mundo: o 5G. A rede que oferece uma conexão ultrarrápida e estável e que abre o caminho para a interatividade on-line total deve começar a ser ligada nas capitais.  

A expectativa é que, em algum tempo, ações que imaginávamos apenas em filmes de ficção científica se tornem parte do cotidiano, como conectar e gerenciar remotamente muitos objetos ao mesmo tempo: celular, carro, relógio, eletrodomésticos entre dezenas de outras coisas, tudo de forma mais estável e a distância. A baixa latência aliada à rápida velocidade oferecerá um tempo de resposta mínimo e cirurgias feitas remotamente, por exemplo, terão mais chances de acontecer e cidades se tornarão cada vez mais conectadas e inteligentes. 

A ascensão do 5G é algo a celebrar e será muito importante para o desenvolvimento do país. Mas também nos leva a uma reflexão: a realidade do alcance da internet no Brasil, em especial na zona rural. Dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), indicam que cerca de 40% das escolas instaladas em áreas rurais não conseguiram ministrar aulas on-line de maneira regular durante a pandemia de Covid-19, afetando cerca de dois milhões de estudantes.  

Outro dado impressionante: números do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que quase a metade – 49% - das famílias residentes nas áreas rurais não tem acesso à internet. Nas cidades, esse índice cai para 25%. Outro empecilho é em relação aos custos: a internet rural é mais cara porque, muitas vezes, são necessárias antenas e equipamentos nas propriedades mais distantes. 

Há também disparidades regionais. Enquanto no Sul e no Sudeste as escolas no campo são razoavelmente bem servidas de equipamentos de informática e acesso à internet, com índices de conectividade superiores a 80% no Sul do País, nas escolas rurais do Norte esse número é inferior a 20%. 

A conexão à internet também é importante para o trabalho no campo. Produtores conectados têm muito mais condições de exercerem melhor a lida no campo e aumentarem a produtividade nas lavouras. A tecnologia aumenta a precisão em tópicos como clima, uso de fertilizantes, utilização dos terrenos, colheitas etc. A rede também possibilita o aumento na compra e venda de insumos e mercadorias dos produtores. 

Por isso, antes mesmo do 5G, que, como dissemos, será muito bem-vindo ao país, é preciso aumentar o acesso às redes de 4G nas zonas rurais, em especial nas regiões mais distantes dos grandes centros. É necessário melhorar a conectividade em escolas, empresas agrícolas e nas fazendas, sejam elas pequenas, médias ou grandes. A população do campo precisa ter as mesmas condições de acesso tecnológico à população urbana. 

Felizmente, deveremos caminhar para isso, já que o leilão do 5G, realizado no ano passado pelo governo federal, prevê que as empresas vencedoras para instalação e exploração da nova tecnologia também contemplem as áreas rurais com serviços de internet de boa qualidade, principalmente nas regiões onde o sinal hoje em dia é muito fraco ou mesmo inexistente. 

É importante reconhecer o esforço dos governantes em criar e manter as instituições de ensino para a população rural, mas é necessário um esforço conjunto, entre governo e sociedade civil, para melhorar o acesso à internet no campo, seja para o ensino, seja para o lazer e seja para o trabalho.  

Nós temos orgulho da nossa produção agrícola e temos motivos para isso. Mas é preciso oferecer no meio rural os mesmos benefícios tecnológicos dos centros urbanos. Mais do que democracia tecnológica, trata-se, com toda certeza, de fatores que vão impulsionar o crescimento do país como um todo.

 

Fonte: Agência EY